Em geral temos visto muita dificuldade dos cristãos lidarem com os elementos culturais, transformando-os muitas vezes em práticas da doutrina cristã. Decerto, percebendo ou não, toda instituição humana reproduz uma cultura. Não há como imaginarmos um grupo de pessoas sem os seus valores, hábitos, costumes e conceitos, frutos de expressões culturais. Por exemplo, por que nos assentamos em uma cadeira e não em um tapete no chão no estilo oriental? Sabemos que o quadro da última ceia de Leonardo da Vinci não representa a realidade da época de Jesus, tendo em vista que o pintor põe o Mestre assentado, juntamente com os seus discípulos, à mesa segundo o modelo ocidental. Assim, ele fez, porquanto interpretou a cena bíblica segundo as referências culturais de sua vivência e experiência. Da mesma forma como muitos de nós, no início da vida cristã, pensávamos no "fundo de uma agulha", ao qual Jesus fez referência quando falou sobre a dificuldade de algum rico entrar no reino dos céus, como sendo algum instrumento de costura. Apenas conhecendo o contexto histórico e cultural da época é que entenderemos o verdadeiro pensamento do Mestre ao fazer tal consideração. Com isso, queremos dizer que muito de nossa interpretação e visão do mundo dependem das influências culturais que recebemos. Em uma certa região da Índia os pais se reúnem para uma "cerimônia" nada comum entre os povos. De uma torre de 15 metros de altura lançam os seus bebês para serem amparados por uma rede ou cama elástica improvisada. O objetivo não é machucar as crianças. Parece que os pais acreditam que dará vida longa e saúde aos seus filhos. E o que dizer quando os chineses comem carne de cachorro? Não podemos nos esquecer que os hindus é que ficam aterrorizados conosco quando comemos carne de vaca.
Quando nos reportamos às Escrituras, percebemos que a Igreja Primitiva também teve que lidar com os aspectos culturais. Interessante que o apóstolo Paulo escrevendo uma de suas cartas, deixa uma orientação para as mulheres não cortarem o cabelo e fazerem o uso do véu no templo. Acreditamos que tais conselhos são representações dos valores da época e do contexto cultural. Por conseguinte, o que pode ser errado hoje em termos culturais, pode ser certo amanhã ou mesmo o contrário. A doutrina, isto é, a Palavra de Deus não muda, mas os elementos culturais estão sempre sofrendo modificações. O mundo de hoje não é o mesmo de ontem. Assim, como a igreja cristã contemporânea não é a mesma igreja cristã do passado. Temos o mesmo Senhor e Salvador, o mesmo evangelho da Cruz e o mesmo Espírito Santo que nos consola, mas os costumes e os valores eclesiásticos são diferentes. No passado, uma jovem foi excluída de sua igreja local, uma igreja de nossa denominação, por ter sido encontrada pedalando uma bicicleta. Será que alguma igreja batista teria coragem de fazer isso nos dias de hoje? Em uma antiga revista de nossa denominação foi publicado um artigo de um pastor conhecido, no entanto, hoje já na glória, criticando o cinema e dizendo que como crentes em Jesus não deveríamos frequentar tal tipo de ambiente. Será que algum pregador de nossa denominação teria coragem de dizer hoje que cinema é pecado? Bem, com os exemplos já citados, fica claro que os costumes mudam, pois a cultura muda, inclusive, os costumes e a dinâmica eclesiástica. Ou será que alguém ainda imagina que a igreja de hoje é a mesma de todos os tempos no sentido cultural?
Obviamente que nem toda expressão cultural é legítima. Entre os esquimós era comum receber um visitante compartilhando a esposa. Reconhecemos que isso nunca será agradável a Deus em nenhuma época nem mesmo em qualquer contexto cultural, tendo em vista que o sexo é para a intimidade do casal. Mas, precisamos deixar claro que, nem tudo o que é diferente significa que seja pecado. Será, por exemplo, errado um pastor usar um "laptop" no púlpito? Preferimos a Bíblia impressa. Não somos muito achegados a tanta modernidade, mas dizer que é pecado, aí já seria uma atitude um tanto legalista. Nem Jesus em suas campanhas evangelísticas ou missionárias carregava Bíblia. Ou será que carregava? A Palavra de Deus estava em Seu coração, em Sua vida e prática ministerial, não em Suas mãos ou debaixo de Seus braços. Mas, vem uma pergunta que não quer calar: como podemos nos ajustar à verdade de Cristo, considerando que algumas coisas dependem mais do momento e do contexto social e cultural? A Palavra de Deus nos oferece algumas dicas. Apresentamos aqui algumas delas sem destacar a ordem de importância. Todas são imprescindíveis:
1. É motivo de louvor? A Bíblia diz que "antes seja o vosso propósito não pôr tropeço ou escândalo ao irmão" (Romanos 14:13). Somos livres em Jesus, mas "vede que essa liberdade não seja de alguma maneira escândalo para os fracos" (I Coríntios 8:9). Logo, "Portai-vos de modo que não deis escândalo nem aos judeus, nem aos gregos, nem à igreja de Deus" (I Coríntios 10:32).
2. Glorifica o nome do Senhor? "Portanto, quer comais quer bebais, ou façais outra qualquer coisa, fazei tudo para glória de Deus" (I Coríntios 10:31). "E tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como ao Senhor, e não aos homens" (Colossenses 3:23).
3. Traz algum acréscimo para o Reino? "Porque Deus não é Deus de confusão, senão de paz, como em todas as igrejas dos santos" (I Coríntios 14:33). "E, se um reino se dividir contra si mesmo, tal reino não pode subsistir" (Marcos 3:24).
4. Revela o amor de Cristo? "O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece. Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal; Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade; Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor nunca falha" (I Coríntios 13:4-8).
5. Valoriza o templo do Espírito? "Ou não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não sois de vós mesmos?" (I Coríntios 6:19).
6. Promove Edificação? "Todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas convêm; todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas edificam" (I Coríntios 10:23).
7. Fortalece a comunhão? "Sujeitando-vos uns aos outros no temor de Deus" (Efésios 5:21). "Não sejamos cobiçosos de vanglórias, irritando-nos uns aos outros, invejando-nos uns aos outros" (Gálatas 5:26). "Amai-vos cordialmente uns aos outros com amor fraternal, preferindo-vos em honra uns aos outros" (Romanos 12:10).
8. É justo? "E o efeito da justiça será paz, e a operação da justiça, repouso e segurança para sempre" (Isaías 32:17).
9. Está em harmonia com os ensinos das Escrituras? "Toda a Escritura é divinamente inspirada, e proveitosa para ensinar, para redarguir, para corrigir, para instruir em justiça" (II Timóteo 3:16). "A lei do SENHOR é perfeita, e refrigera a alma; o testemunho do SENHOR é fiel, e dá sabedoria aos símplices" (Salmos 19:7).
10. Favorece a grande comissão? "Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; Ensinando-os a guardar todas as coisas que eu vos tenho mandado; e eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos. Amém." (Mateus 28:19,20).
Esperamos com este artigo ter contribuído para o fortalecimento do Reino. E se porventura estiver persistindo ainda alguma dúvida diante de qualquer circunstância social ou cultural, lembremo-nos de que "aquele que tem dúvidas" deve evitar o que for, pois "tudo o que não é de fé é pecado" (Romanos 14:23).
Pr. Adriano Xavier Machado